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Hipódromo: porta de entrada do turfe

Sergio Barcellos

Foto JCB 003O conjunto das instalações do Hipódromo Brasileiro é, sem dúvida, um dos maiores e mais belos patrimônios arquitetônicos do Rio de Janeiro, algo capaz de despertar emoção estética em todos aqueles que o conhecem de perto.

Hoje custaria uma quantia inimaginável construir suas cinco magníficas tribunas em estilo neoclássico com as marquises em balanço, as pistas de corrida e treinamento, o conjunto de cocheiras das centenárias vilas hípicas que abrigam mais de 1.900 boxes.

E, ainda, decorar isso tudo com balcões de apostas em carvalho maciço, fantásticos mármores, luminárias, bronzes, arandelas, vidros importados, a sanca pintada à mão do grande salão de apostas da tribuna social com os cavalos e as cores das blusas do tempo da inauguração, mais os amplos espaços interiores ornados por lustres do mais puro cristal Baccarat (que remontam a meados do século XIX), sem mencionar pisos de cerâmica e de madeira que datam da virada do século XX. Sob qualquer aspecto que se examine, o Hipódromo Brasileiro é de uma suntuosidade sem par.

Nele, tudo, literalmente tudo, em seus 640.000 m² de área, respira majestade. Não há outra palavra. Na verdade, o Hipódromo Brasileiro é um tributo – mais que isso, é uma solene reverência – à qualidade da imaginação, ao poder da vontade, a um temperamento que privilegiava coragem por oposição à timidez, ao apetite pela aventura em lugar do amor pelas facilidades da vida, dos homens que o erigiram. E o legaram a nós, à cidade, ao público, e aos sócios do clube.

PadockNesta já longa vida, tive oportunidade de conhecer e admirar alguns belos hipódromos de outros países e outros turfes. Igual ao nosso? Nenhum. Com os verdes do entorno das montanhas e a visão protetora do Cristo Redentor? Nenhum. Com a lagoa à frente, e o Jardim Botânico ao lado? Nenhum. Com aquele paddock sombreado e tecnicamente perfeito ao redor da estátua do Dollar? Nenhum. Com este céu azul-anil que nos protege nas tardes ensolaradas dos fins de semana felizes das corridas do Rio de Janeiro? Nenhum. Garanto: nenhum!

De tempos em tempos, porém, parece que nos esquecemos de quanto herdamos dos fundadores do clube. De tempos em tempos, como que nos acostumamos ao que é único nesta vida. Nada de novo, faz parte da natureza humana a pretensa intimidade com o belo. Ocorre, porém, que não é possível esquecer, pois esquecer equivaleria a desonrar a memória dos homens que fizeram o Jockey Club Brasileiro. Em uma palavra, esquecer seria ser insensível à arte suprema de sua criação.

É um fato que o turfe, na acepção da palavra, se faz a partir da qualidade e da correção dos hipódromos, pois eles é que são – e continuam sendo –, a porta de entrada de novos adeptos desse esporte e dessa atividade.  Quem tem dúvidas a respeito, deveria conhecer melhor as revelações da extensa pesquisa do poderoso The Jockey Club, da América, onde isso está afirmado e reafirmado com uma clareza de ofender a vista.

Quem tem dúvidas, é só perguntar aos ingleses por que eles resolveram praticamente reconstruir Ascot há alguns anos, e aos franceses por que vão fazer o mesmo com Longchamp, a partir deste ano, depois de terem reformado e ampliado Chantilly.

JCB1Não, nós não precisamos construir um novo Hipódromo Brasileiro. O que está aí, é mais que apropriado e suficiente, inclusive porque suas tribunas atendem ao moderno pressuposto de aproximar os espectadores, o mais possível, do local do espetáculo, no caso as pistas de corrida. Até nisso, os construtores do Hipódromo Brasileiro foram perfeitos quando projetaram a distância ideal entre as pistas e as tribunas, e os ângulos de inclinação destas últimas.

Para nós, herdeiros desse imensurável patrimônio, basta mantê-lo protegido, intocado, e conservado – e isso, felizmente, está acontecendo. Basta ter olhos de ver, sem qualquer outro viés, senão o de constatar, o que vem sendo feito, a partir de maio de 2012, para recuperá-lo. E recuperando-o, devolver-lhe seu antigo orgulho e majestade.

DSC003Primeiro, tratou-se de recuperar seus espaços internos, como o paddock, por exemplo. Depois, vieram os muros externos, com as grades e painéis que os compõem – e são quase dois quilômetros de muros e painéis da mais fina alvenaria –, que ameaçavam apodrecer e cair, em meio à mais completa degradação a que foram submetidos durante muito tempo.

Depois dos muros, seguiu-se a renovação dos enormes espaços atrás das tribunas principais, cujos pisos se soltavam ao menor contato, e cuja trama subterrânea de encanamentos de há muito havia se perdido. Hoje, já é possível perceber a longa vereda entre os fundos da tribuna C e a tribuna social totalmente recuperada, organizada, ajardinada, e limpa.

Mas não parou aí. À esquerda da tribuna social, terminou a construção das instalações da sala de reuniões do Conselho do JCB, tão magnífica quanto à do terceiro andar da sede social do centro da cidade, inclusive, com a mesma esplêndida mesa em forma de ferradura que lá havia, e os mesmos ornamentos que compunham seu espaço. E, de quebra, os jardins externos, é verdade.

Tudo a deixar entrever, em um vigoroso simbolismo, que o melhor local para abrigar o Conselho de uma sociedade promotora de corridas é o seu hipódromo, ao lado da visão das pistas e dos cavalos de corrida, essência mesma e justificativa de sua existência.

Mas há mais. Há em curso a recuperação da tribuna dos profissionais e das instalações de pesagem, guarda das fardas, e sala de arreios, bem assim, da parte frontal da tribuna A (que não mais servirá de estacionamento de automóveis). E há, também em curso, a recuperação da tribuna C, e a vinda de novos restaurantes e galerias de arte em seu entorno – que restaurantes e hipódromos são hoje uma constante dos turfes desenvolvidos (vide Longchamp, Ascot, Belmont, Palermo, etc).

Tudo isso atende, também, ao compromisso do Jockey Club Brasileiro, hoje uma área inteiramente tombada pela municipalidade, de devolver ao hipódromo sua antiga forma e concepção e, a partir daí, poder valer-se da isenção dos tributos correlatos.

pistaIgualmente, prossegue o trabalho de uniformização da pista de areia, onde várias experiências já foram levadas a cabo (inclusive com a tentativa de fazê-la “fibrada”, como as modernas pistas de areia da França). Não é um trabalho fácil, pois significa encontrar a mistura (leia-se, a granulometria ideal do material que a reveste). Nem por isso, entretanto, vai-se desistir de torná-la a mais uniforme possível.

Tais obras, seja do ponto de vista físico, seja do ponto de vista dos recursos já alocados – e por alocar –, é grande, sem dúvida.  Mas sem hipódromo não existe possibilidade de turfe próspero. O período áureo do turfe brasileiro começou, em 1926, com a construção do novo hipódromo do Rio de Janeiro e as cocheiras das vilas hípicas. Antes disso, tudo se resumia a um romântico vir a ser.

O tempo passou, é verdade. As gerações se sucederam, a sociedade mudou, e com ela os hábitos da população. Nada mais normal. Agora, é hora de se pensar em como transferir a correção e funcionalidade do hipódromo para o movimento geral de apostas (MGA), e retomar a caminhada do turfe do JCB. Pois uma coisa não existe sem a outra.

Foto JCB 022Para recuperar o MGA de qualquer sociedade promotora de corridas neste início de século XXI, é preciso mais. É preciso investir em novas tecnologias da informação, em geração de imagens nos padrões mundiais de qualidade, em maior capilarização das apostas, em estruturas de controle, em marketing da atividade, etc.

Poder-se-ia mencionar uma série infindável de necessidades a respeito. A obra é imensa e o homem é pequeno. Nenhuma dessas necessidades, no entanto, escapa ao entendimento e à compreensão do Jockey Club Brasileiro.

Neste momento, terminada a obra de construção do anel de fibra ótica em torno do hipódromo, diga-se, um projeto de anos (sem isso, não haveria a menor e mais remota possibilidade do uso da moderna tecnologia da informação), trabalha-se, neste instante, na elaboração de um novo site de apostas, mais efetivo e mais rápido. Da mesma forma, prosseguem as etapas necessárias à geração das imagens das corridas em alta definição, ao lado da revitalização e modernização da rede de agentes credenciados (40 novas agências já foram alvo deste processo).

Tão importante quanto tudo isso, porém, é que, ao lado dessas iniciativas, se estuda, neste momento, a possibilidade de agregar à base dos apostadores locais uma parcela relevante dos apostadores do exterior, através do simulcasting internacional pleno, e da troca permanente de experiência com um dos maiores operadores mundiais de apostas em corridas de cavalo.

O que tudo isso quer dizer, em essência? Quer dizer que todas as naturais ansiedades pela recuperação do tempo perdido estão entendidas pelo Jockey Club Brasileiro, e – ao contrário do que se possa imaginar –, suas manifestações são sempre bem-vindas.

jcb PORTAPois é exatamente do embate das opiniões, da crítica, e do contraditório, que as sociedades avançam. O Jockey Club Brasileiro, mesmo sendo um microcosmo dessa sociedade, não está – nem se sente –, infenso ao contraditório. Ignorá-lo seria um erro de perspectiva. Esse erro não será cometido.

Ao fim e ao cabo, começando pelo hipódromo e prosseguindo pelas demais iniciativas e investimentos diretamente relacionados com as corridas; eventualmente errando e tendo que refazer caminhos e opções, como qualquer outra instituição do seu tamanho e porte, o que o Jockey Club Brasileiro de 2014 espera é somente poder estar à altura de seus insignes fundadores.

Cujas dúvidas e dificuldades – e houve muitas, diga-se de passagem –, se perderam pelos corredores do tempo diante da vastidão, da estatura, da dignidade, e da nobreza de sua obra.

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