Assinada pelo conhecido jornalista Nicholas Godfrey, da editoria internacional, o Racing Post, um dos maiores veículos de informação do turfe mundial, dedicou em sua edição de 5 de agosto uma extensa reportagem sobre o Jockey Club Brasileiro e o turfe do país de modo geral.
Ao contrário do que ocorreu na Olimpíada de Londres 2012, quando o turfe local e os esportes olímpicos constituíram dois mundos à parte, o artigo menciona os esforços do JCB para, aproveitando-se da ocasião, tentar divulgar as corridas de cavalo no Brasil.
A íntegra completa da matéria encontra-se a seguir, traduzida para o português. Quem preferir ler o original em inglês basta clicar aqui: pág 1 e pág 2.
HOLOFOTES SOBRE A CIDADE OLÍMPICA
“Magic Man” e os seus amigos: a influência do Brasil sobre o mundo das corridas
Por Nicholas Godfrey, com tudo o que você precisa saber sobre o esporte na cidade hóspede da Olimpíada.
5 de agosto de 2016
Dois anos após o país receber a Copa do Mundo, as mentes brasileiras vão focar sobre outra grande competição esportiva durante as próximas semanas, quando o Rio hospedará a Olimpíada.
Durante duas semanas a partir do dia 6 de agosto – mais outra quinzena de Paralimpíada em setembro – a nação mais acostumada a ficar em êxtase com a ‘Seleção’ e o estilo de futebol samba (às vezes), voltará a sua atenção sobre correr, pular, nadar e atirar. Mais faixas girando e empurrando aros, caso a ginástica rítmica seja sua praia, apesar de provavelmente não ser.
Porém, pelo menos uma outra disciplina esportiva acontecerá durante a Olimpíada, sob a forma de corridas de cavalos, o que significa o Hipódromo da Gávea, em um cenário de cartão postal do Rio de Janeiro.
Apesar das coisas não estarem como já estiveram, as corridas de cavalo podem se gabar de uma fina tradição no Brasil. “A indústria de corridas no Brasil oferece empregos diretos para 16.000 pessoas e nós temos ao redor de 280 haras.” diz Sergio Barcellos, vice-presidente do Jockey Club Brasileiro (JCB) que é o proprietário da Gávea. “O JCB é um clube rentável – mas, outros, como o Jockey Club de São Paulo, o segundo maior clube de corridas, neste momento não.”
Se ainda não há escassez de corridas – aconteceram mais de 3.673 corridas no Brasil em 2014 – o esporte está declinando há décadas, desde sua era áurea durante os anos 1950 e 1960, quando uma visita à Gávea era considerada o auge da moda e o jóquei Luiz Rigoni, três vezes campeão do maior páreo do país, o Grande Prêmio Brasil, estava no seu auge. Tanta era a popularidade de Rigoni, que pelo menos duas canções foram escritas em sua homenagem. O “Homem do Violino” (inspirado por um dos seus apelidos) e o tango “Dá-lhe Rigoni.”
Em anos mais recentes, a maior fama turfística do Brasil veio das suas exportações, tanto de cavalos de corrida quanto de profissionais do turfe – entre os quais, o mundialmente renomado Silvestre de Souza
Mesmo o legendário jóquei Jorge Ricardo, que provavelmente defenderá o seu próprio recorde de vitórias na carreira, no final do ano, seguindo à aposentadoria de seu rival de muito tempo, Russell Baze, se foi para Buenos Aires, Argentina, em 2006, em busca de oportunidades melhores, após lograr a respeitável marca de 26 títulos no Rio.
OS JÓQUEIS
Lá Fora…
Já diz muito sobre o alto padrão de equitação no Brasil, saber que Silvestre de Sousa é somente a sua terceira melhor exportação. No topo da lista, vem a sensação brasileira baseada em Hong-Kong, o ‘Magic Man’ Moreira, o único jóquei que pode seriamente rivalizar-se com Ryan Moore como um dos melhores do planeta, e o óbvio “próximo” em um cenário mundial mais amplo. Moreira, 31 anos, rasgou o livro dos recordes em Singapura, um onde ele montou oito vencedores sobre oito páreos em Kranji, no dia 26 de setembro de 2013, antes de se mudar para Hong-Kong. Moreira ganhou um primeiro campeonato em Hong-Kong na campanha repleta de recorde de 2014-2015, que logrou um total sem precedente de 145 vitórias; além disso, ele demoliu o recorde de 2015-2016 com 168 vitórias. Não satisfeito, conseguiu uma seqüência de vitórias no Grupo I em Hong-Kong com animais como a super-estrela da milha Able Friend e animais de primeira classe como Peniaphobia, Designs On Rome e Military Attack. Moreira estabeleceu um duplo recorde memorável em páreos de sprints na Dubai World Cup, em 2014, com Amber Sky e Sterling City. Ele venceu também duas provas de Grupo I australianos com Brazen Beau.
No Brasil, porém, a fama de Moreira faz o papel de segundo violino da orquestra para o legendário Jorge Ricardo (foto). O “garoto do poster” das corridas brasileiras durante mais de duas décadas, Ricardo está agora com 54 anos e é visto há muito tempo como um ícone nacional. Ele venceu seu primeiro campeonato de jóqueis no Rio em 1982 – e não retrocedeu até se mudar para Buenos Aires em 2006, registrando com freqüência 400 vitórias por temporada.
Ricardo venceu quatro títulos da Argentina desde sua mudança, tornando-se o primeiro jóquei no mundo a atingir a marca de 12.000 vitórias em maio de 2013. Mas, a exceção de demorados períodos à margem com acidentes de raia – ele passou 6 meses sem correr, lutando contra um câncer em 2009 – somente assim ele foi superado por Russell Baze na corrida mundial. Com 12.670 vitórias em seu cartel enquanto a temporada mais recente terminou no dia 30 de junho, Ricardo está a caminho de reivindicar o seu título, antes tarde do que nunca.
O incansável Silvestre de Sousa é provavelmente mais famoso na Grã-Bretanha que no Brasil, onde ele mal chegou a ser um nome conhecido quando trocou São Paulo pela Europa em 2006. Após um início hesitante, em sua nova carreira, dez anos depois, ele agora enfrenta Ryan Moore para reivindicar seu segundo título das estatísticas inglesas de jóqueis após terminar bem na frente em 2015.
Outros brasileiros que deixaram as suas marcas incluem Eurico Rosa de Silva, baseado em Toronto, Canada, nomeado vencedor do “Prêmio Soberano” – de fato um campeonato de jóqueis – em 2010 e 2013. E Nelson de Souza venceu o Handicap de novembro (Come On Johnny 2005) e a Northumberland Cup (Toldo 2006) durante um período na Grã-Bretanha.
Enquanto isso em casa…
Com mais de 3.500 vitórias na Gávea, o veterano Carlos Lavor angariou mais vitórias que qualquer outro jóquei ativo ainda baseado no Brasil. Triplo vencedor do GP Brasil, Lavor encontra-se em terceiro lugar, atrás somente de Ricardo e do seu prolífico predecessor Juvenal Machado da Silva – “Garrincha” para o “Pelé” Ricardo na Gávea – na lista de todos os tempos. Outros jóqueis na liderança técnica baseados no Rio são Alex Mota e Valdinei Gil, que venceu o Derby deste ano com a potranca Daffy Girl em março. Vagner Leal, que liderou as estatísticas de São Paulo também se mudou para o Rio. Entre os treinadores baseados na Gávea e na liderança, encontram-se o penta- campeão do GP Brasil, Dulcino Guignoni, Venancio Nahid e o jovem reinante Roberto Solanés.
OS CAVALOS
Lá fora…
Aconteceram exportações brasileiras “top de linha” para os Estados Unidos desde 1990, quando o par de estilo taurino Siphon e Sandpit, dois animais duros de bater, promoveram as virtudes do puro-sangue brasileiro com uma seqüência de performances no mais alto nível. Ambos treinados por Richard Mandella, eles terminaram em segundo e terceiro após Singspiel na Dubai World Cup de 1997.
Os dois foram seguidos rapidamente por muitos outros, entre os quais Riboletta, cinco vezes vencedora de Grupo I na Califórnia, o top sprinter Pico Central e Hard Buck, que terminou em segundo lugar em Ascot no King George VI de 2004. Einstein, nascido e criado no Brasil venceu quatro provas de Grupo I para a treinadora Helen Pitts, entre eles a Santa Anita Gold Cup de um milhão de dólares em março de 2009.
Um outro grande nome do Brasil foi o especialista da milha na grama, Leroidesanimaux, que terminou em segundo lugar na milha da Breeders’ Cup de 2005. Ele era propriedade do Haras TNT, o nome de competição do criador Gonçalo Torrealba, que arrasou nos Estados Unidos quando comprou as históricas cores vermelha e azul da Calumet Farm, no dia em que o famoso haras foi leiloado, em 1992.
Mais recentemente, os cavalos brasileiros continuaram a demonstrar suas qualidades numa cena mais ampla, em particular no Festival de Dubai. Brasileiros e ex-brasileiros se encontraram entre os vencedores – mais em Nad Al Sheba que em Meydan – mesmo se eles pareciam estar correndo com um preço no selim, destinados, mais cedo ou mais tarde, a terminar correndo para outros proprietários, se demonstrassem ser bons.
Um caso especial foi Heart Alone, um vencedor de “Grade I” na Gávea, que ganhou com um rateio de 25-1 em um sprint na raia de areia do Grupo III para o treinador Antonio Cintra Pereira no seu início em Dubai, em 2006. Daí, ele foi transferido diretamente para o treinador Ismail Mohammed, e nunca mais venceu.
Outros vencedores brasileiros em Dubai incluem os animais Imperialista e Happy Boy, ambos vencedores do primeiro segmento do Maktoum Challenge, em 2007 e 2008, respectivamente para os treinadores Cosme Morgado e Pedro Nickel Filho. Os dois foram vendidos para a Godolphin; nenhum venceu uma outra corrida.
O vencedor da Dubai World Cup, Gloria de Campeão, não foi vendido pelo seu proprietário Stefan Friborg (o mesmo do prefixo “Energia”), tendo iniciado a vida vencendo páreos tanto na Gávea quanto em São Paulo para Morgado. Friborg o levou para a França e o entregou a Pascal Bary, na orientação de quem o cavalo se tornou um renomado competidor internacional, vencendo também a Singapore Airlines International Cup, antes de um excelente triunfo na inauguração da World Cup em Meydan, em março de 2010, sob a direção de Tiago Jesus Pereira.
Bal a Bali, que venceu a Tríplice-Coroa do Rio de Janeiro em 2014 e foi nomeado “Cavalo do Ano”, exerce agora seu ofício para Mandella na Califórnia, onde ficou aquém das grandes expectativas nele depositadas.
Enquanto isso em casa…
O status relativo do Brasil em termos continentais está nitidamente ilustrado pelo recorde para a criação do país no Gran Prêmio Latino Americano, o campeonato anualmente rotativo entre países, sul-americanos uma espécie de Breeder´s Cup em um único páreo. O Brasil lidera entre as cinco maiores nações sul-americanas com dez vitórias em 32 edições, desde que o evento de US$ 500,000 foi inaugurado em 1981, e cavalos treinados no Brasil venceram as seis edições organizadas no Brasil (três na Gávea e três em Cidade Jardim, em São Paulo).
Ricardo venceu o páreo cinco vezes, incluindo um par de vitórias do grande Much Better em 1994 e 1996. Por duas vezes “Cavalo Sul Americano do Ano”, Much Better era propriedade do haras TNT e treinado por João Luiz Maciel.
Ele venceu também o GP Brasil, a corrida nacional de maior prestígio, e o GP Carlos Pellegrini em San Isidro, 1994, de fato o “Arco do Triunfo” do continente – ano em que terminou descolocado, atrás de Carnegie, no Prix de l’Arc du Triomphe, Paris, França . Lembre-se que, tanto ele quanto Sandpit, foram derrotados por Villach King, terminando em segundo e terceiro lugares numa chegada apertada do GP Brasil de 1993, em uma das mais memoráveis corridas já disputadas em solo brasileiro.
Mais recentemente, o recorde brasileiro no GP Latino Americano está menos alvissareiro. Tendo ganho quatro das cinco primeiras edições nos anos 1980, numa clara indicação de uma mudança na guarda continental, o Brasil venceu somente duas vezes durante a última década, ambas as vezes em casa. Além disso, apesar do Livro de Honra mostrar que a edição mais recente na Gávea em março foi vencida por Some In Tieme, o resultado esconde uma multidão de fatos. Montado por Waldomiro Blanco e treinado por Gladston Santos, o filho de três anos de Shirocco ganhou a corrida somente um mês após o evento, quando a estrela argentina Don Inc, que veio de casa para vencer, foi desqualificada após não passar num teste de dopagem para o esteróide anabolizante stanozolol.
O líder da última temporada, Juno, de dois anos, baseado em São Paulo, foi comprado pelo Team Valour para correr nos Estados Unidos, enquanto English Major abriu o caminho para a geração mais nova do Rio de Janeiro.
OS GARANHÕES
Lá Fora…
O campeão de turfe estadunidense Leroidesanimaux, que morreu esse ano no Lanwades Stud, lidera as exportações de garanhões criados no Brasil, uma cortesia do brilhante Animal Kingdom, que venceu o Kentucky Derby em 2011 antes de adicionar a Dubai World Cup dois anos mais tarde. Um filho de Candy Stripes, que passou da Argentina para o Kentucky, Leroidesanimaux foi criado no Brasil pelo haras Bagé do Sul e correu para o haras TNT no Brasil e nos Estados Unidos, onde o vigoroso castanho foi treinado pelo grande Bobby Frankel, para vencer três provas de “Grade I’.” Aposentado em Stonewall no centro do Kentucky, ele produziu 19 vencedores “black-type”, antes de sua mudança para Lanwades, em setembro de 2013. Seus primeiros produtos europeus são esperados para 2016.
Enquanto isso em casa…
A operação dominante de criação no Brasil é o haras Santa Maria de Araras da família Bozano, no coração do país do puro sangue brasileiro, em Bagé. Seus garanhões importados “top de linha” incluem Ghadeer – “O nosso extraordinário Ghadeer, o grande nome dos últimos 30 anos”, segundo a própria publicidade do haras – e os líderes atuais Wild Event, Public Purse e Put It Back.
Garanhões em “shuttle” desempenham um papel de primeiro plano, o que não é tão surpreendente tendo em vista que a programação de corridas no Brasil tende a seguir o modelo europeu, com principalmente corridas de meia-distância e na grama. Coolmore e Darley mandaram regularmente garanhões para o Brasil: e os visitantes recentes incluíram: Shirocco, Manduro, Refuse To Bend, Rock of Gibraltar, Holy Roman Emperor, Soldier of Fortune e Roderic O´Connor.