Titular do Haras São José do Bom Retiro, Gilberto Gama é o convidado especial desta semana na coluna de entrevistas do site do Jockey Club Brasileiro, Papo de Turfe.
Como o turfe entrou em sua vida?
GG: Desde criança (por volta dos oito anos de idade) ia com meu pai e meu irmão Guilherme ver os cavalos trabalharem na Gávea. Meu pai tinha cavalo com o Claudemiro Pereira na Vila Hípica 30, depois com Altamir Vieira na cocheira 34. Depois dos trabalhos nos encontrávamos na cocheira com os amigos dele, como Newton Coelho, Luis Felippe Índio da Costa, Arnaldo Borges, Paulo Roberto Arroxellas, Amadeu Azambuja, Arnaldo Souza e Silva e muito outros. Depois costumávamos a ir tomar café da manhã em um bar no Leblon. Meu pai começou como proprietário nos anos 1950. Ele montou o Haras em Teresópolis em 1976, onde até hoje sigo criando. Com Stud Gondarem (sociedade entre ele e um amigo) ganhou o “Henrique Possolo” em 1960 com a égua Zarmi, criação do Mondesir. Quando meu pai morreu em 1995, comprei o Haras de meus irmãos, pois era o único interessado em cavalos (havia meu irmão Guilherme, mas ele morava na Indonésia na época). Reformei o Haras, mudei vários conceitos, como mandar as éguas para Bagé, apenas recriar os potros em Teresópolis, assim pude aumentar o número de produtos criados. Troquei pastagens, fiz mais piquetes, coloquei caminhador, fiz mais cocheiras, etc…
O que as corridas de cavalos representam para você?
GG: Representam o resultado final de mais de três anos de trabalho para criar um potro de corrida. Claro, representam também um fantástico entretenimento, competição e muita emoção, sem dúvida. Mas, acima de tudo, as corridas são um negócio e deveriam ser encaradas cada vez mais como tal.
Quais são melhores cavalos/éguas que já viu correr?
GG: Vi vários cavalos fantásticos, como Itajara, Much Better, Falcon Jet e Flying Finn, Mensageiro Alado, Coray, Canzone, Pico Central, Ribolleta, Redatore, Super Power, Virginie, entre tantos outros. E, para falar dos meus, sem duvida Baby Speedy e Voando Baixo. Mas acho as comparações relativas, até muitas vezes descabidas, pois as turmas eram diferentes (mais fortes, mais fracas etc…).
Cavalo/égua mais bonito que já viu?
GG: Vários também, mas me lembro da imagem de um cavalo muito bonito mesmo (e um craque também), que foi o Dono da Raia. O Voando Baixo dá filhos muito bonitos e tinha um em especial, criação do Stud Milenovecentos, que era uma verdadeira pintura, chamava-se Whisfull Thinking, de treinamento do Jonas Guerra. O Barão da Cevada era um belíssimo animal e também merece ser citado. Sandpit, enfim, foram muitos.
Melhor animal de sua propriedade e/ou criação?
GG: Melhor de propriedade: Baby Speedy, Voando Baixo e, um pouco abaixo, a Tutelada. De criação: Pototó, ganhador do Derby de 2005; Imperialista (ganhador do Maktoum Challenge em Dubai e vendido para o sheik Mohamed por alta soma), e, recentemente, o potro Not To Tell You, que era um dos três melhores da geração 2008, mas que morreu precocemente em agosto de 2011, quando nem tinha completado os três anos.
Quais jóqueis fazem a diferença?
GG: Acho que a coisa mais complicada para um jóquei é ter a noção do train de corrida e de percurso, o Juvenal era craque nisso. Claro que o Ricardinho é presença obrigatória em qualquer lista. Dos outros que atuam hoje na Gávea: C. Lavor, J. Leme, D. Duarte, M. Cardoso e o M. Mazini.
Quais os melhores treinadores em sua opinião?
GG: Cosminho, Guignoni, Beto Solanes, Venâncio Nahid e Bebeto Morgado (Pai e Filho). O Alemão (Sampaio) sem dúvida tem grande resultado e é uma realidade também. Gosto ainda do “olho” que o Luis Esteves tem para escolher cavalos, além de fazer um ótimo churrasco. Agrada-me também o trabalho do Reisinho (também bom no churrasco), embora nunca tenha tido cavalo com ele.
Melhores garanhões da atualidade no turfe nacional?
GG: Os que têm o melhor resultado percentual qualitativo. O Wild Event é muito bom, mas, só para ficar no próprio Araras, talvez o Signal Tap tenha um resultado percentual até melhor, sem falar que deu alguns indivíduos “extraclasse”, com destaque para Too Friendly. O Crimson Tide é uma realidade, um excelente garanhão. Redattore teve muitas chances e correspondeu. Nedawi dá cavalos excelentes, ganhou várias provas de Grupo I e ninguém fala nele. Public Purse, Dubai Dust, First American, American Gipsy (mesmo com os problemas de fertilidade), isso, claro, sem falar nos que vem em shuttle. Mas reparem como só falei de garanhões em Bagé. No Paraná tem o Amigoni, que está tendo um bom resultado, mas ainda é cedo para falar. São Paulo agora se mexe para trazer garanhões, mas ficou um bom tempo sem a qualidade que tinha no passado. Romarin foi muito bom, mas morreu cedo. Lingari, Refuse To Bend e Val Royal, entre outros, foram trazidos em shuttle e vão ajudar a melhorar o padrão de São Paulo.
Melhores garanhões da história do turfe brasileiro?
GG: Ghadeer, Roi Normand e Clackson, dos que acompanhei mais de perto. Os mais antigos deixo para o Marcos Ribas me orientar. Mas para mim o melhor foi Ariosto, claro! (Pai do Voando Baixo e do Baby Speedy).
Seu momento inesquecível no turfe?
GG: Como criador, o Derby vencido pelo Pototó (na foto acima), a vitória em Dubai do Imperialista e a última conquista do Not To Tell You, no dia do GP Brasil 2011. Mas eu vibro intensamente a cada vitória de cavalo de minha criação. Como proprietário, as Milhas Internacionais vencidas por Baby Speedy no Rio e por Voando Baixo em São Paulo, e ter tido a Tutelada como líder invicta de uma geração. Isso sempre devidamente acompanhado e comemorando com os amigos mais próximos.
Algum páreo marcante?
GG: A milha ganha pelo Baby Speedy no Rio. Arrepio-me até hoje quando lembro. O Lavor dá uma partida nele no meio da reta e o cavalo se estica, se abaixa e sai tirando, ganhando por uns sete corpos, batendo o recorde do “Presidente da República”. Até aquele dia ninguém havia corrida abaixo de 93 na Milha Internacional. E a vitória do Pototó no Derby, como criador e proprietário.
Qual foi sua maior tristeza com cavalos?
GG: As tristezas quando se é criador são as mais variadas e dos mais diversos tipos. A morte precoce do Pototó no seu segundo ano como garanhão foi ruim. Mas, a morte de um potro como Not To Tell You, em um início promissor de carreira, foi a maior perda. Mas, como disse, criador tem de estar pronto para isso.
O que espera do turfe brasileiro nos próximos anos?
GG: Que as pessoas parem de brigar, parem de priorizar seus egos somente, pensem de verdade no Turfe, seja qual for a situação politica do Clube. Aliás, gostaria que o Turfe não fosse Clube. Enquanto for Clube não tenho grandes expectativas. Mas se algo/alguém puder mudar isso que seja feito e todos devem ajudar. Com o Turfe gerido como um negócio acredito em um grande salto de qualidade e de prêmios. Enquanto isso não acontece ajudarei no que puder e estiver à meu alcance, como sempre fiz.
O que você diria para um novo proprietário que está começando a investir em cavalos de corrida?
GG: Diria para ter cavalos em sociedade, pois o custo está tão alto que sozinho o sujeito acaba ficando com “raiva” do negócio e desiste rápido. Mas, de novo, essa mentalidade de formar grupos/condomínios de proprietários deveria ser mais difundida, trabalhada com campanhas de marketing ao longo de vários anos, ou seja, ser encarada como um investimento com retorno a médio e longo prazo. Quando falo isso, imediatamente lembro que longo prazo não combina com o “modelo de Clube” que temos. Aí desanima um pouco. Mas, como adoramos cavalos, vamos remando com força para melhorar o turfe.
por Celson Afonso – Fotos: Gerson Martins, Karol Loureiro e internet
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