A publicação norte-americana TDN (Thoroughbred Daily News), em 29 de janeiro de 2013, disse de reunião a ser efetivada na Califórnia entre conceituados veterinários de lá e de New York. O assunto seria o uso indiscriminado de Lasix e Butazolidina, um para os animais que sangram e o outro para tirar dores. Esse assunto vem de longe. Em 2012 compareceu às corridas na Gávea um jovem veterinário formado em Minas Gerais, se não engano em faculdade em Viçosa. Ele tinha vindo ao Brasil para rever a família, e já ia voltar para o seu trabalho, em um pequeno hipódromo nos Estados Unidos. Disse que ele e outros como ele atendiam diariamente cinquenta cavalos cada um, só e sempre para serem medicados desde o dia seguinte de uma corrida até o dia da seguinte. Eles seguiam uma relação dos remédios permitidos e respeitavam os proibidos. Alguns corredores, sem a medicação diária, não conseguiram sequer andar direito. Duas das principais medicações permitidas são o anti-hemorrágico Lasix e a Butazolidina, que mascara problemas tirando dores. A tal reunião iria tentar naturalmente conscientizar os veterinários dos exageros absurdos que eles praticam irresponsavelmente.
O caso do Lasix é curioso. Ele é difundido de tal forma, que seu nome comercial já substitui os dos remédios anti-hemorrágicos. Há muitos remédios anti-hemorrágicos, mas só se fala e usa Lasix. É como o caso da lâmina de barbear, que é mais conhecido como gillette, o nome do seu inventor. Mas no caso do Lasix, há um porém, o Lasix não é só um anti-hemorrágico, ele também tem nas suas duas primeiras horas de aplicação, uma ação bronco dilatadora, que aumenta a capacidade pulmonar. Acabar com o Lasix e substituí-lo por um apenas anti-hemorrágico é enfrentar um fantástico arsenal farmacêutico de lucros formidáveis e gigantescos, e mais do que briga de cachorros grandes, é de leões para cima, de dragões ou dinossauros.
A indústria do Lasix não aceitaria pacificamente uma drástica diminuição das vendas de Lasix, e suprimir de sua fórmula o remédio bronco-dilatador iria equipará-lo aos outros anti-hemorrágicos. Não sou veterinário, posso estar errado, mas é por aí. Quanto ao remédio para tirar dores, é muito difundido nos Estados Unidos onde o conceito não é de uma competição esportiva de qualidades acima de tudo, mas na verdade, uma guerra química. No entender do tal veterinário brasileiro que lá trabalha, muitos hipódromos iriam se fechar por falta de cavalos.
Não sei se esse princípio de preocupação com a permissibilidade excessiva de remédios para correr tem alguma coisa a ver com o que aconteceu na reunião em 2012, em Paris, por ocasião do Arco do Triunfo. Anualmente lá se concentram autoridades hípicas das mais importantes do mundo inteiro, são sempre entre cinquenta e cem nomes importantes do turfe mundial, e são apresentados e discutidos o que há de mais importante, moderno e recente no mundo do turfe. No final da mais importante reunião mundial do gênero, em 2012, o Presidente do evento dirigiu-se em plenário, diretamente para o representante dos Estados Unidos e disse em alto e bom som que a comunidade turfística mundial aguardava com interesse as alterações que o turfe civilizado mundial para o necessário enquadramento daquele país nas normas internacionais. Em outras palavras, quis dizer que já passou da hora de promover corridas como se fosse um rico circo, e não corridas de cavalos regidas por filosofia e normas internacionais.
Eu acho difícil que em curto prazo, eu diria mesmo que a médio ou mesmo longo prazo, seria muito difícil uma adequação norte-americana ao resto do mundo turfístico civilizado, pois acho que seria além do possível acabar com a absurda permissibilidade de remédios para correr, ante a enorme quantidade de animais dependentes de drogas, muitos filhos de pais também dependentes, substituindo sanidade por debilidade. Parece-me mais provável que o turfe norte-americano se desligue, ou seja desligado do resto do mundo, e fique, alicerçado por seu enorme investimento financeiro na área, com um turfe particular, dentro de suas próprias fronteiras mantido por muito dinheiro e facilidades.
Eu faço sinceros votos para que eu esteja redondamente enganado, mas não consigo acreditar no turfe norte-americano sem Lasix, sem Butazolidina, sem medicações diárias, com treinadores treinando os seus animais convenientemente de forma adequada a cada um e não generalizada à base de curtas, violentas e repetidas partidas, com jóqueis que em sua maioria entendam que ganha quem passa em 1º no disco e não aqueles que desde a largada querem correr na frente. Não acredito que as agarradeiras nas ferraduras dos anteriores sejam proibidas, também não acredito que os discos de chegadas nas pistas norte-americanas sejam removidos do meio da reta de chegadas para o final da reta. Enfim, seria quase impossível transformar o circo em verdadeiro evento turfístico. Talvez em provas de Grupo I nos principais hipódromos possa haver certo controle, mas até os melhores centros promotores de corridas não fazem convenientemente exames anti-dopagem, isso dito pelos próprios treinadores de lá. As necessárias mudanças mexeriam em muito nos bolsos de muitos, há grandes interesses em jogo.
Um dos motivos da tal reunião foi o resultado de uma pesquisa feita junto ao público jovem, que demonstrou um desagrado quanto ao uso abusivo de medicações, e com isso diminuindo a frequência nos hipódromos.
Acredito que o problema possa até sair pela tangente, isto é, postergar datas de compromissos, fiscalização apenas quando de eventos importantes, e por aí vai.
Tomara, sinceramente, que eu esteja errado.