Em um dos meus mais recentes textos, eu me referi de passagem, sem declinar o nome, de um dos mais simpáticos e ganhadores haras paulista. O haras, que mantinha em Cidade Jardim um Stud muito bem cuidado, e que tinha como pontos altamente positivos o treinador Alcides Morales e o jóquei Clovis Dutra, chama-se Santa Theresinha, e ficava bem próximo à cidade de São Paulo. O seus proprietários eram os irmãos Philipe e Jorge Azer Maluf. Trouxeram da Inglaterra dois garanhões de padrões médios, ambos reprodutores de corredores de velocidade, bons em distancias curtas, o que era absolutamente adequado para um haras iniciante. Antes de se pretender provas nobres, mais difíceis, mais qualitativas, é tentar ganhar no início das atividades páreos comuns. É melhor ganhar páreos comuns do que entrar descolocado em provas nobres. É melhor subir a escada degrau a degrau, dando tempo a novos conhecimentos e a favor da experiência. Esse foi um ensinamento que os simpáticos irmãos Maluf receberam do Capitão Bela Wodianer(FOTO), o melhor homem de cavalos que já conheci em toda a minha vida. O Capitão Bela era um homem incomparável em sua área, tanto na da criação como nas corridas. À sua época, era o campeão europeu dos jóqueis amadores, em cerca de 500 montarias venceu 100 páreos. Como era muito educado e agradável, atendia a todos, com extrema simpatia, todos que lhe vinham pedir conselhos. Os irmãos Maluf então importaram dois cavalos ingleses de característica de velocidade para o Santa Theresinha, Tamino e Melody Fair. Os dois foram bons, dentro do propósito inicial de, antes de eventuais vôos mais altos, ganhar páreos comuns. Àquela época, páreos comuns chamados por volta de 1.600 metros não eram programados por permanentes falta de suficientes inscrições. E assim, Tamino e Melody Fair fizeram a festa. Tamino mais fixado em 1000 metros na grama, e Melody Fair ia um pouco mais além, mas sempre em páreos curtos.
Com o passar do tempo, os irmãos Maluf entenderam de importar um garanhão de grande fundo, de distancias largas, para, com as filhas dos dois garanhões velocistas, tentar produtos com predileção para as distancias médias. Trouxeram Alceste, que tinha antecedentes de grande fundo tanto na linha alta como na baixa. Por cima havia Alycidon, produtor de animais ganhadores de provas importantes em 3.000 metros e mais. Pela linha baixa, entre outros estava Darius, outro fundista, entre outros. A intenção foi inteligente, lógica, mas não é assim que a Natureza entende. Na criação dos cavalos de corrida, a Natureza não é como a média de café com leite, usando a mistura do preto com o branco dá uma cor intermediária, às vezes mais clara e em outras mais escura, mas sempre uma cor intermediária entre o preto do café com o branco do leite. A Natureza, na criação dos cavalos de corrida, tem como norma básica a incessante procura por melhor qualidade, e o fundista com o velocista pode dar um fundista com boa aceleração, um velocista com mais resistência, ou um velocista com menor velocidade, ou ainda um fundista com menos fundo. É o eterno jogo de xadrez, entre os criadores e a Natureza. Centenas ou milhares de exemplos poderiam ser alvitrados, mas mesmo em raros casos que poderiam ser lembrados em pesquisas, é assim que a banda toca. O principio básico, é a velocidade dentro do tamanho do percurso a ser percorrido. Todos os páreos em quaisquer distancias, são sempre vencidos pelo cavalo de maior média de velocidade do páreo. Ganha quem chega à linha de chegadas com o menor tempo, aquele que foi o mais veloz dentro daquele percurso, quem fez o tempo menor. Logo, a velocidade é fundamental. Mas só velozes tem um limite natural já nas provas que não, digamos, de 1.000 a 1.300 metros, como simples exemplo.
Por outro lado, ao extremo, cavalos de característica e pedigrees fundistas não tem como acompanhar os bons em distancias intermediárias, digamos entre 1.600 e 2.400 metros. Há que haver um equilíbrio entre as habilidades dos velocistas e as dos fundistas. Antigamente as principais provas brasileiras eram em 3.000 metros ou mais. O excelente Haras Mondesir, como simples exemplo, assim como o seu sucessor Haras Santa Ana do Rio Grande brilhou intensamente durante muitos anos com o impressionante Waldmeister, um fundista que era amparado em éguas das melhores linhas internacionais. Mas os tempos mudaram, a tendência mundial do encurtamento das distancias, alterou o melhor comportamento dos criadores. Velocista com velocista com freqüência sai um “espoleta”, corre 500 metros e diminui. Por outro lado, fundista com fundista anula na maioria das vezes a necessária velocidade, e os simples ganhadores chegam ao estágio de cavalos de tração. No turfe civilizado, o europeu, os fundistas com exagero são normalmente castrados, pois em principio seriam péssimos garanhões, e enviados para provas de obstáculos, com distancias que vão de 4.000 metros a 6.000 ou mais. No mundo do turfe, que eu saiba, o primeiro a entender o problema foi o primeiro Aga Khan.
No turfe moderno, e já de algum tempo, os melhores garanhões estão entre os garanhões de provas nobres entre 1.600 metros e 2.400, no máximo. Voltando ao Haras Santa Theresinha, na prática o fundista Alceste diminuiu a velocidade das filhas de Tamino e Melody Fair, e em distancias maiores foi um fracasso. E o simpático haras teve que fechar as suas porteiras.